Durante muitos anos, a captura de
quelônios para a alimentação e para a comercialização foi uma atividade
constante na vida de moradores de diversas comunidades que formam a região de
Juruti Velho, no município de Juruti/PA. Atividade essa que reduziu
drasticamente a população de quelônios. Com o passar dos anos, os próprios
moradores foram percebendo que a captura dos quelônios estava se tornando uma
atividade difícil, que a quantidade de animais estava diminuindo. A fim de
reverter essa situação, moradores de Juruti Velho foram em busca de ajuda e
encontraram no Projeto Pé-de-Pincha uma alternativa que, ao longo de dez anos, tem ajudado a garantir
o repovoamento de quelônios no lago da região.
O projeto Pé-de-Pincha foi criado no
ano de 1999 por comunitários do município de Terra Santa/PA e por pesquisadores
da Universidade Federal do Amazonas – UFAM. O nome do projeto refere-se às
pegadas do Tracajá (Podocnemis unifilis)
que na areia ficam o formato de “pinchas” (tampinha de refrigerantes de
garrafas de vidro). O Pé-de-Pincha tem como missão preservar e conservar as
populações de quelônios da Amazônia, bem como realizar trabalhos sociais com as
comunidades ribeirinhas. Atualmente, o Pé-de-Pincha está presente em 15
municípios.
“Nós temos alcançado resultados
maravilhosos. No contexto geral já fizemos a soltura de mais de um milhão de
filhotes. É muito bom, é muito satisfatório. Muita gente que chegou criança
para participar do projeto hoje em dia já é adolescente, adulto, e tem repassado
a mensagem da conservação para as gerações. A gente vê os resultados. O lago tá
repovoado. Se você perguntar para as pessoas como era esse local antes e como
está depois da chegada do projeto você vai perceber que há muitas diferenças.
Em locais onde praticamente não havia mais quelônios, hoje em dia você encontra
bastante. E isso é muito engrandecedor”, declarou Cléo Ohana, engenheira
florestal, integrante da coordenação do Pé-de-Pincha.
No município de Juruti, o Pé-de-Pincha
atua desde o ano de 2003, beneficiando dezesseis comunidades da região de Juruti
Velho. Nesses quase dez anos de atividades os comunitários, com o auxílio dos
profissionais da UFAM, já depositaram nas águas do Lago Juruti velho mais de 32
mil quelônios. A iniciativa, além de garantir o repovoamento do lago, evita a
extinção de diversas espécies de quelônios.
O trabalho dos comunitários começa no
mês de setembro, época da desova dos quelônios. Os animais encontram nas praias
formadas nas margens do lago Juruti Velho o local ideal para depositar os ovos,
que, posteriormente são recolhidos por moradores e colocados em chocadeiras
naturais, também nas margens do lago, mas em locais protegidos da ação de
predadores, principalmente do homem. O nascimento dos animais acontece dois
meses depois. Após o nascimento, os quelônios recebem tratamento adequado até
completarem sete/oito meses, para então ser soltos nas águas do lago.
O dia
dedicado à soltura dos quelônios começa com um grande ritual. No mês de
setembro, a equipe da VOX GREEN acompanhou o trabalho do Pé-de-Pincha
desenvolvido na comunidade Surval, em Juruti Velho. Um ritual, que mobiliza
toda a comunidade, antecede a soltura dos animais. Na capela dedicada a Nossa
Senhora do Livramento, comunitários realizam a celebração da vida. Na frente do
altar, uma bacia cheia dos pequenos animais é colocada a fim de receber a
proteção divina.
Após a
celebração, vem a segunda parte da programação, que acontece no barracão
comunitário. Na oportunidade, os moradores que participam ativamente do projeto
recebem certificados pelos trabalhos prestados à natureza. Aos demais são
repassadas orientações que vão auxiliá-los no combate à captura ilegal de
quelônios no lago Juruti Velho.
A terceira
e última etapa do ritual acontece às margens do Lago Juruti Velho. É quando os
pequenos animais são conduzidos por moradores ao seu novo lar. As crianças são
as mais entusiasmadas. Desde pequenas elas participam do Pé-de-Pincha e
aprendem o quanto é importante preservar a natureza. Nesta etapa, a comunidade
Surval soltou 1.158 quelônios de várias espécies.
A parceria
com a ACORJUVE – Associação das Comunidades da Região de Juruti Velho tem sido
primordial para que o Pé-de-Pinha alcance seu principal objetivo. Boa parte da
estrutura necessária para o desenvolvimento das atividades do projeto nas
comunidades da região é cedida pela ACORJUVE. Na comunidade Surval, o
comunitário Reginaldo Souza Guerreiro, é um dos que percorrem a região reunindo
com moradores e repassando uma série de orientações a fim de preservar o lago e
garantir a permanência dos quelônios. “Através do diálogo a gente vai
conquistando muita gente. Mas, infelizmente, muitas pessoas ainda não têm essa
consciência de preservar, querendo só destruir”, lamenta o comunitário, que faz
parte da diretoria da ACORJUVE.
Um dos problemas que a região enfrenta
para a preservação dos quelônios é a falta de fiscalização. “Precisamos de
agentes ambientais voluntários para fazer a fiscalização e com isso não deixar
que o trabalho seja prejudicado”, declarou o engenheiro de pesca Alex Leão,
integrante do Pé-de-Pincha.
“O papel da comunidade é inspecionar,
fiscalizar, evitar que as pessoas coletem os ovos dos locais protegidos. Muita
gente só pensa em pegar os ovos e os quelônios para comer, sem se preocupar com
a preservação dos animais. O trabalho não para, é contínuo, muita vigilância”,
informou o coordenador do Pé-de-Pincha na comunidade Surval, Davi Assunção
Matos.
Em 2014
haverá nova soltura de quelônios no Lago Juruti Velho. De acordo com Davi
Assunção, neste ano já foram recolhidos mais de 50 ovos de quelônios só na
comunidade Surval. “No ano que vem a nossa meta é soltar pelo menos três mil
quelônios”, informou o coordenador.
ANO
|
QUANTIDADE
|
2003
|
1.527
|
2004
|
1.755
|
2005
|
3.109
|
2006
|
4.320
|
2007
|
3.697
|
2008
|
3.193
|
2009
|
1.630
|
2010
|
4.410
|
2011
|
5.061
|
2012
|
3.753
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário